quinta-feira, 11 de outubro de 2012

A Proclamação da República segundo o Jornal "A Provincia de São Paulo"


         O texto que segue é uma transcrição na íntegra do jornal Provincia de São Paulo, de 16 de novembro de 1889, hoje conhecido como o Estado de São Paulo. A leitura sugere uma reflexão sobre o acontecimento que marca o inicio do período republicano na Brasil observando a ênfase dada ao exército e sua importância no processo, o forte apelo popular que não foi característico. Interessante é o fato de que em nenhum momento é citado a participação do setor mais interessado na proclamação da república: as Oligárquias agrárias. Nada muito estranho aos tempos atuais.

Boa leitura!


A PROVINCIA DE SÃO PAULO

15 DE NOVEMBRO DE 1889

GLORIOSO CENTENÁRIO DA GRANDE 
REVOLUÇÃO

PROCLAMAÇÃO 

DA 

REPUBLICA BRAZILEIRA

Recebemos hontem o seguinte telegrama:

Foi proclamada a Republica no Brazil. Consta que o governo provisório será organisado com o general Deodoro e Quintino Bocayuva.

Affirmam outros que o governo será constituído pelo general Deodoro, Quintino Bocayuva e Benjamim Costant.

Foi convocada uma reunião popular para acclamação do governo. O ministério foi obrigado a assignar a sua demissão.

O barão de Ladeiro foi ferido e acha-se em perigo de vida.

Logo que recebemos este telegrama, fizemos distribuir o seguinte boletim:

Cidadãos,

Noticias da Corte annunciam a proclamação da Republica – a forma de governo que exprime o sentimento nacional! !

Unamo-nos! Para garantir a ordem, porque o novo regimen nasce da livre manifestação popular!

Povo! O primeiro dever republicano neste momento é ser calmo, previdente, justo, tolerante, para se enérgico na organisação!

A Republica significa a paz, o progresso, a civilização.

Unamo-nos sem distincção de partidos para firmamos esse novo regimen que nos ha de trazer a gloria, a grandeza e a felicidade!

Viva a Republica!

Esta noticia não causou enthusiamo; produziu delírio indiscriptível; nem uma opposição, nem uma sombra de tristeza, o contentamento foi geral, as acclamações á nascente Republica traduziam-se por alegres expansões de patriotismo e de fraternidade! O povo confrate pisava nas ruas, em grandes exclamações de jubilo.


Pouco depois recebíamos o seguinte telegrama:

Os soldados das guarnições arrancaram as coroas dos bonets, conservando apenas o numero dos regimentos a que pertencem.

Todas as guarnições adherem ao movimento.

O ferimento de Ladeiro foi devido mais por imprudencia  sua do que por intuito aggressivo. Ministério deposto.

A família imperial acha-se em Petropolis.

Nota-se profundo contentamento popular e preparam-se festas para a acclamação da Republica. O tenente Vinháes do Paiz tomou conta do telegrapho.

Os officiaes do exercito fazem em pessoa policiamento para evitar conflictos.

Nunca uma republica foi proclamada com tanto brilhantismo e em tanta paz.

Em geral os interesses envadicados de longos séculos pelos interesses dynasticos offerecem grande resistência á sua eliminação; e por vezes, a Victoria do povo é marcada pelo sacrificio sanguinolento e terrível. Para explicarmos este brilhante resultado, só temos uma phrase que synthetisa o movimento todo; e, ao mesmo tempo, esprime o nosso eterno agradecimento:

Honra ao Exercito Brazileiro, que acaba de completar a sua acção benefica; iniciada em 1831, mostrando o caminho do exílio a um tyrano!

Durante todo o dia o povo permaneceu em constante actividade agitando-se pelas ruas, inquieto, ancioso a espera do reconhecimento da Republica em São Paulo.

Pelas 5 horas, da tarde, depois de uma conferencia da commissão executiva do partido republicano, foi o dr. Luiz Pereira Barreto, parlamentar com o presidente da provincia, afim de saber-se qual a attitude que pretendia manter diante da gloriosa revolução republicana.

O Sr. General Couto de Magalhães, para entregar o seu posto impoz apenas a condição de que chegassem as ordens do governo republicano, constituído no Rio.

De uma das janellas do Restaurant do Globo, o dr. Rangel Pestana communicou ao povo esta resolução da presidencia.

O governo provisorio para São Paulo, indicado pela Comissão Permanente do Partido Republicano, era composta dos drs. Rangel Pestana, Prudente de Moraes e Coronel Mursa.

Diante da resolução presidencial, o povo guardou uma calma digna e ao mesmo tempo patriótica.

A anciedade publica continuava ainda, quando recebemos o seguinte telegramma:

O povo reunido no edificio da camara municipal, ouviu a leitura da proclamação da Republica, na qual não interviram nenhum dos chefes do movimento.
Consta que o governo provisorio assignou um decreto confiando a família imperial á guarda do exercito e do povo.
O movimento revolucionário repercutiu em quasi toda a provincia.

De Santos recebemos o seguinte telegrama:

O povo reunido no paço da camara municipal acclamou um governo provisorio, generalidade da população e as autoridades policiaes, adheriram a Revolução.

Desde ás 4 horas estão em conferencia os membros do governo composto dos cidadãos A. Lacerda, A. C. Teles Netto, dr. Martin Francisco Filho, Ernesto Gomes Henrique Porchat, Manoel Franco Vianna, Walter Wright, dr. Leão Ribeiro, José Azurem Costa, e Guilherme Souto.

Ás onze horas grnde massa de povo reunida no Club Republicano, proclamou o governo provisorio, composto dos cidadãos Rangel Pestana, Prudente de Moraes e coronel Mursa.

O dr. Prudente de Moraes e Rangel Pestana declaram acceitar posto em que os collocava a confiança popular, convidando ao mesmo tempo o povo para assistir hoje ás 11 horas a proclamação official da Republica, na camara municipal.

As sacadas do club achavam-se diversos officiaes do 10º regimento de cavallaria, desfraldando um delles a bandeira republicana.

O Dr. Bernardino de Campos declarou que a Commissão do Partido tomava a si o policiamento da cidade, que com effeito foi logo posto em pratica.


 
Reina grande jubilo em toda a população.

Viva a republica!

De Campinas foi-nos expedido os seguinte despacho telegraphico:

Saudamos a Provincia de São Paulo pelo advento de Republica Brazileira!

Outro telegramma de Santos:

O povo Santista reunido congratula-se pelo advento da Republica.

Reina completa ordem.

Viva o Exercito!

A noite recebemos mais a seguinte communicação do Rio:

A cidade está em plena paz, reinando grande jubilo por parte do povo todo.

O povo, o Exercito e a armada vão installar o governo provisorio, que consultará a nação pela convocação de uma constituinte.

Ha geraes acclamações á Republica.

A versão mais corrente sobre o movimento é a seguinte:

O general Deodoro, emfermo hontem, tendo synapismo nos pés soube a meia noite que a segunda brigada tencionava fazer pronunciamento de revolta. Pela madrugada dirigiu-se a S. Christovam e voltando ao Campo de sant’Anna viu aproximar-se o barão de Ladario.

Ordenou ao official que fosse entender-se com o ministro, usando de toda cortezia.

O oficial limitou-se a dar voz de prisão de Ladario. Este, sem responder, disparou o revólver contra official. O general Deodoro gritou ao official que não o mattassem, porém, não pôde evitar os tiros que feriram o barão.

Abertas as portas do quartel todas as forças reunidos confraternisaram-se levantando vivas ao general Deodoro.

Foram dadas diversas salvas de 21 tiros, annunciando a Victoria do movimento.

Os ministros numa sala, ahi ficaram até uma hora da tarde e depois que assignaram a demissão foram mandados embora.

Neste momento acaba de ser prezo o conselheiro Affonso Celso.

Foram-nos ainda enviados muitos outros telegrammas, quer do interior quer do Rio e que não publicamos porque falta-nos o tempo para a expansão do jubilo.

Rio, 15 ás 12 50 da madrugada.

No Paço ha muita gente, conselheiro de estado etc

O imperador mandou os srs. Dantas e Correia conferenciarem com o General Deodoro.

Corre o boato de que o motivo da prisão do Sr. Affonso Celso foi elle não ter cumprido com a palavra dada ao general Deodoro de ir tratar dos passaportes para a Europa, indo ao Paço conferenciar com o imperador, indicando o sr. Siveira Martins para organisar  ministerio!

Consta acharem-se presos também o sr. Candido de Oliveira aqui e o sr. Silveira Martins em Santa Catharina.

O povo passa cantando a Marselheza.

O general Deodoro destacou rondas para guardar os bancos.

O policiamento da cidade está sendo feito por praças do exercito e do corpo da policia.

Governo provisório aclamado na Camara Municipal: Deodoro, Benjamin Constant, Wandenkolk, Jardim e Quintino Bocayuva.

Consta que foram nomeados: chefe provisorio do Rio Grande do Sul o visconde de Pelotas e membros do governo provisorio Julio de Catilho e Ramiro Barcellos.

Foram dissolvidos o Senado, a Camara e o Conselho de Estado.

Santos, 15 á 1 50:

O governo provisorio constituido  em Santos, obtida a adhesão de todas as autoridades, communica que acha-se a cidade em paz funccionando theatro e mais divertimentos públicos no meio de regosijo geral.
Viva a Republica!

PROCLAMAÇÃO

Revive a Nação!  Pelo seu orgam o mais autorizado – o POVO! – foi proclamada a Republica no Paiz!

Já annunciada pelas manifestações da Opinião Publica, profundamente radicada na consciencia nacional, apparece agora como um facto consummado!

Sob a BANDEIRA DE REPUBLICA desapareceram os velhos Partidos e unem-se todos BRAZILEIROS para a felicidade da Patria.

Chegou o período da organisação, e é preciso que todos os homens de boa voontade se congreguem para salvar a patria do perigo que ia correndo. A generosidade do POVO BRAZILEIRO, o seu amor á ordem, o seu espirito de paz garantem desde ja a mais completa tranquilidade no novo regimen de paz, de justiça e de concordia!

O POVO, no exercicio da sua soberania, acclamou o GOVERNO PROVISORIO que se esforçará para manter firme esse regimen. Sem odios, sem velhos resentimentos, distribui á justiça, levará a todos os pontos da provincia o sentimento que domina a NAÇÃO neste novo periodo que se lhe abre, cheio de esperanças que se hão de tornar uma realidade, affirmando a grandeza, o progresso e a civilização da PATRIA.

Unamo-nos, CIDADÃOS! e prestemos culto á Liberdade, á Justiça, á Egualdade e á Fraternidade, que devem prender os membros de uma grande Nação.

Viva a nação Brazileira!

Viva a Republica!

Viva o Exercito!

Viva a Armada!

Viva a Provincia de São Paulo.

Rangel Pestana.

Prudente de Moraes.

O Coronel Mursa não assigna por estar ausente.

fonte: http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/18891116-4373-nac-0002-999-2-not

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